Como garantir a propriedade industrial de uma marca?

Disputas, como da Christian Louboutin e Bruna Silverio e da Apple e Gradiente, jogam luz sobre a importância do registro de marca

Definir o que é uma marca e garantir a propriedade industrial dela não é tarefa fácil. Diversas empresas, marcas e entidades acabam recorrendo a ações judiciais para batalhar por seus direitos. “Hoje negócios globais e locais competem por uma mesma necessidade humana e, por isso, o desafio jurídico para se proteger um valor construído é cada vez maior”, salienta Beto Almeida, CEO da Interbrand.

Uma companhia que vem enfrentando problemas quanto a isso no Brasil é a grife francesa Christian Louboutin. Em 2021, a grife descobriu que a marca de sapatos brasileira Bruna Silverio utilizava sua famosa sola vermelha em seus calçados. Então, a grife fechou um acordo com a marca brasileira. Porém, pouco tempo depois a Bruna Silverio rompeu o contrato e entrou com uma ação judicial, alegando que a francesa não tem os direitos sobre o solado vermelho no Brasil.

Vale destacar, no entanto, que o pedido foi pela proteção do solado vermelho apresentado pela Christian Louboutin em 2009, época em que as “marcas de posição” – que devem combinar um sinal distintivo e uma posição singular e específica – não eram reguladas no Brasil. A regulamentação só entrou em vigor pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) em 1º e outubro de 2021.

“Apenas recentemente o Brasil passou a aceitar o registro de marca de posição, que é a marca formada pela aplicação de um sinal distintivo em uma posição específica do suporte, um objeto”, explica a Dra. Flávia Tremura, advogada especialista em Proteção dos Direitos de Propriedade Intelectual, sócia e head de marcas do escritório Kasznar Leonardos. A advogada ainda enfatiza que o primeiro registro de marca de posição foi publicado nesse mês e foi concedido à Osklen para os três ilhós aplicados na parte frontal do tênis.

Mesmo assim, em abril deste ano, o Tribunal de Justiça de São Paulo reconheceu o solado vermelho como uma marca da francesa Christian Louboutin. Apesar disso, no início deste mês, o INPI negou o pedido da grife francesa para proteção do solado vermelho de seus calçados. O examinador de marcas Marcelo de Oliveira Pimentel negou a solicitação alegando que o solado vermelho não cumpre o requisito da distintividade do sinal aplicado, presente no item 5.13.2 do Manual de Marcas.

Procurada por Meio & Mensagem, a diretoria de marcas do INPI informou que a decisão técnica se fundamentou na proibição legal de se registrar cores como marca, conforme o art. 124, VIII, da LPI, e definido no Manual de Marcas: “Não será registrável como marca de posição a aplicação de sinal não distintivo em um suporte”.

Outra marca que está tendo problemas com o direito de uso de marca no Brasil é a Apple. Na realidade, a disputa entre Apple e a empresa brasileira de eletroeletrônicos Gradiente pelo direito da marca iPhone no Brasil vem desde 2013.

A Gradiente, hoje intitulada IGB Eletrônica, argumenta que solicitou o registro da marca “Gradiente Iphone” ao INPI, sete anos antes do lançamento oficial do iPhone da Apple, que foi concedido em 2008. Porém, há dez anos, a Apple entrou com um pedido para que esse registro fosse cancelado, alegando que já fazia o uso do prefixo, em letra minúscula, para seus produtos antes de 1998, como iPod, além de ser mundialmente conhecida.

Apesar de ganhar em instâncias inferiores, no Supremo Tribunal Federal (STF), a Gradiente segue na frente da disputa. Porém, na sexta-feira, 9, deste mês, o STF interrompeu o julgamento e o ministro Alexandre de Moraes pediu vista no processo, que estava em análise desde o dia 2 deste mês. Com isso, o julgamento pode ser adiado em até 90 dias.

Ao Meio & Mensagem, o INPI disse que o sistema marcário brasileiro é atributivo, conforme o art. 129 da LPI, onde a propriedade da marca se dá pelo registro validamente expedido. E que no caso da marca IPHONE, a Gradiente possui um registro no INPI-BR anterior ao pedido de registro de marca da Apple.

Critérios considerados pelo INPI

Segundo a Lei de Propriedade Industrial, são suscetíveis de registro como marca os sinais distintivos visualmente perceptíveis, não compreendidos nas proibições legais. “Para ser registrável, a marca deve ter caráter distintivo. Ou seja, não pode ser genérica, necessária ou descritiva e deve apresentar novidade relativa, devendo guardar suficiente distintividade em relação às marcas já registradas na mesma categoria”, salienta a Dra. Flávia Tremura.

A advogada ainda destaque o artigo 124 da Lei de Propriedade Industrial destaca todas as proibições para o registro de uma marca, como, por exemplo, imitação ou reprodução de marca anterior de terceiro para identificar produtos ou serviços idênticos, semelhantes ou afins passíveis de causar confusão; imitação ou reprodução de nome comercial, indicação geográfica, de marca coletiva ou de certificação; cores e suas denominações; marca que o titular não poderia desconhecer em função de sua atividade, dentre outros.

Vale ressaltar que os pedidos de direitos sobre propriedade industrial do INPI são avaliados segundo os critérios de liceidade (expressão, figura, desenho ou qualquer outro sinal contrário à moral e aos bons costumes ou que ofenda a honra ou imagem de pessoas ou atente contra liberdade de consciência, crença, culto religioso ou ideia e sentimento dignos de respeito e veneração); distintividade (sinal de caráter genérico, necessário, comum, vulgar ou simplesmente descritivo, quando tiver relação com o produto ou serviço a distinguir, ou aquele empregado comumente para designar uma característica do produto ou serviço, quanto à natureza, nacionalidade, peso, valor, qualidade e época de produção ou de prestação do serviço, salvo quando revestidos de suficiente forma distintiva); e disponibilidade (reprodução ou imitação, no todo ou em parte, ainda que com acréscimo, de marca alheia registrada, para distinguir ou certificar produto ou serviço idêntico, semelhante ou afim, suscetível de causar confusão ou associação com marca alheia).

Propriedade industrial de marca

Apesar de a forma de identificar uma marca, uma empresa e seus produtos e serviços ter evoluído com o tempo, a definição tradicional e legal de marca não comporta essas novas formas de identificação, conforme pontua a sócia e head de marcas do escritório Kasznar Leonardos. Isso significa que cores isoladamente, marcas sonoras, olfativas, multimídia, holográficas, de movimento, bem como outras modalidades de marcas não tradicionais não são aceitas para registro no Brasil. “As empresas que usam tais recursos com função marcaria, ou seja, para identificar a empresa, um produto ou serviço, não consegue proteção por meio de marca, sendo necessário buscar essa proteção em outras formas de propriedade intelectual, como o direito autoral”, explica Flávia.

Logo, no caso da Louboutin, segundo a advogada, a questão gira em torno de entender se uma cor isoladamente poderia ser “apropriada exclusivamente por uma única empresa para exercer a função de marca, ou seja, como forma de identificação de seus produtos”.

Uma forma de tentar evitar esses conflitos é, em primeiro lugar, registrar sua marca, suas patentes, seu produto nos órgãos competentes. “Isso ajuda a garantir que você possa utilizar e melhora consideravelmente suas chances de proteger e comercializar seus ativos”, enfatiza o CEO da Interbrand. Entretanto, antes mesmo de lançar uma marca é fundamental fazer uma busca de anterioridades para se certificar que a marca já não está registrada por outra empresa no mesmo segmento, alerta Flávia.

O segundo passo, segundo Beto, é analisar o quanto vale esse ativo intangível, como o valor de marca. “A mensuração de valor de marca é indispensável para proteger seu negócio de oportunistas que queiram se utilizar de algo construído por terceiros para se ter alguma vantagem competitiva gerando confusão para seu consumidor”, complementa.

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Fonte: Meio & Mensagem

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