Com inteligência artificial e características humanizadas, mascotes assumem vozes de marcas e ganham espaço além de seu próprio território de influência
Em julho, o público viu a influenciadora digital Lu em um comercial do Burger King. A personagem, que acabou se tornando a figura mais conhecida do Magalu, apareceu exaltando as características e o preço dos sanduíches da rede de fast food.
O fato de o Burger King apostar em um personagem de outra marca atesta que o poder de conexão e engajamento que essas figuras têm seguem em alta. E, em temos de inteligência artificial e de mais recursos tecnológicos, as mascotes e personagens de marcas podem ganhar funções ainda mais importantes.
A ideia de ter uma figura lúdica para representar a marca é bem antiga. Ronald (McDonald’s), LekTrek (Sadia), Tony (Kellog’s), Baianinho (Casas Bahia), Galinha Azul (Maggi) e Bibendum (o boneco da Michelin) estão, até hoje, no imaginário popular e na comunicação das marcas, funcionando como elemento de conexão entre as empresas e seus consumidores.
“Entre todos os assets de uma marca, a mascote é das mais poderosas e versáteis”, atesta Joyce Moraes, fundadora e diretora geral da Figura Design, consultoria de branding cuja função específica é ajudar as marcas explorarem seu potencial por meio de personagens.
Além de dar a cara e alma para empresas e marcas, os personagens, segundo Joyce, carregam o poder de humanizar as empresas. E com o advento de ferramentas tecnológicas, que facilitam e catalisam algumas fases do processo de desenvolvimento desses personagens. “Hoje já é possível criar, em segundos, uma mascote visualmente incrível ou, no mínimo, o conceito artístico para uma etapa inicial de projeto. No entanto, vale lembrar que o valor de uma boa mascote não está na sua forma, mas sim nas decisões estratégicas que levaram a aquele desenho”, pontua.
A projeção humana dos personagens
Mesmo em meio a um cenário em que o marketing de influência tornou-se ferramenta imprescindível para muitas marcas, é curioso notar que personagens e mascotes ainda seguem firme em estratégias de comunicação de grandes empresas – e, muitas vezes, fazendo o papel de influenciadores, como o caso de Lu, Baianinho ou do Pinguim do Ponto Frio.
Paulo Garcia, cofundador e diretor criativo da Zombie Studio, explica porque essas figuras lúdicas detêm certa vantagem na relação entre marcas e consumidores. Segundo ele, enquanto as pessoas (sejam celebridades famosas ou influenciadores) escolhidas para um casting têm, naturalmente, um background, isso torna um pouco mais difícil de o público se colocar naquele lugar. Já o personagem, de acordo com Garcia, por ser originalmente inanimado e não ter características humanas, permite que, por meio do storytelling, as pessoas se projetem naquela forma.
“Temos também a vantagem de que a mascote é praticamente eterna e pode se renovar ao longo do tempo. O tempo passada e é possível até atualizar a mentalidade deles, um traço ou outro, mas eles vão estar sempre representando a marca no meu melhor estado. Acho que a mascote representa muito aquilo que a gente pode ser”, analisa.
Essa renovação citada pelo cofundador da Zombie Studio, de fato, é algo que as marcas vêm procurando fazer com frequência, sobretudo na era das redes sociais. A Arcor, por exemplo, transformou a Tortuguita, personagem de que dá nome a um de seus produtos mais conhecidos, em TikToker. Em um canal, a tartaruga aparece em situações e brincadeiras características da Geração Z.
No ano passado, a Dorinha, mascote do Azeite Andorinha, criada em 2001, também passou por uma renovação no visual, assumindo as redes sociais da marca e uma característica mais humanizada e dinâmica. Em julho, foi a vez da margarina Claybom, que com mais de 70 anos de mercado já havia apresentado ao público a Menininha Nhac, que estampava suas embalagens, decidiu ampliar esse squad com outras personagens. A mascote ganhou a companhia de outras amigas: Clay, Yala, Bya, Bo e Moa.
E não são apenas os alimentos que recorrem ao carisma das mascotes. Até mesmo setores da economia considerados mais ‘duros’, como o de construtoras, também viram na estratégia uma forma de se aproximar do público. Esse foi o caso da Plano & Plano, incorporadora que, em março, apresentou ao público os Planitos, um time de personagens que representavam os perfis de clientes da empresa.
Evolução da persona
Há décadas, quando essas personagens e mascotes surgiram, sua existência ainda era relativamente limitada. Com o passar do tempo, e com a chegada de ferramentas como a inteligência artificial, a execução e a forma dessas figuras também evoluíram. É o que considera Felipe Andrade, chief creative officer (CCO) da Cheil Brasil.
O criativo dá o exemplo da própria SAM, influenciadora virtual da Samsung, cuja vida e atuação são de responsabilidade da agência. “Estamos buscando cada vez mais possibilidades para atribuir as novas tecnologias ao processo de produção de conteúdo, cenas, cenários e no acabamento do lipsync também. Em alguns meses mais de estudo, teremos certamente novas habilidades para realizar coisas ainda mais sofisticadas”, promete.
O profissional da Cheil explica que essas evoluções e constantes mudanças pelas quais os personagens de marcas passam são necessárias para fazer com que aquela figura evolua do papel de uma mascote para atuar como persona, capaz de compreender o comportamento, humanizando e trazendo para si a responsabilidade de marca. Isso, segundo Andrade, gera a oportunidade dessa personagem atuar em qualquer evento ou situação, mostrando gostos, estilo de vida e, assim, gerando um novo e efetivo ponto de contato entre marca e audiência.
Collabs e intersecções entre personagens
Com todo a aparato tecnológico disponível, os profissionais ouvidos pela reportagem acredito que deve ser cada vez mais comum que personagens e mascotes trafeguem em campanhas de outras marcas. Isso é impulsionado pelo fato de as empresas terem enxergado o grande potencial de engajamento gerado pelas collabs, como destaca Joyce, da Figura Design.
“A colaboração entre personagens de diferentes marcas pode criar narrativas inovadoras e divertidas, que ressoam com o público, gerando maior visibilidade e fortalecendo as conexões emocionais com ambas as marcas envolvidas”, frisa.
Paulo Garcia, da Zombie Studio, concorda com o argumento e acredita que, em um ambiente digital dinâmico e rico, se uma marca ficar envolvida somente em sua própria comunicação, acabará ficando para trás.
“Enquanto as marcas estiverem avançando nesse sentido de olhar o personagem não como um ser inanimado com um ótimo visual, mas sim como um ser vivo, com mensagem e história, essa tende a ser a receita de sucesso”, conclui o profissional.
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Fonte: Meio & Mensagem