Personagens famosos podem ajudar a alavancar as vendas de diferentes produtos. Mas será que a estratégia é boa para todos os empreendedores?
O licenciamento de personagens e filmes é uma tradição na Nutty Bavarian, rede de franquias de castanhas glaceadas, há pelo menos oito anos. Adriana Auriemo, fundadora da empresa, lembra que o primeiro filme a estampar os produtos da marca foi a animação O Que Será de Nozes, lançada em 2014.
Desde então, a Nutty Bavarian assumiu a estratégia como recorrente. “Um dos principais retornos é o awareness que essas campanhas trazem para a nossa marca, fazendo com que as pessoas comprem com mais frequência, pois geralmente são produtos colecionáveis”, diz a empreendedora. Em média, o volume total de vendas costuma aumentar em 8% quando há licenciamento envolvido.
Para Marici Ferreira, presidente da Associação Brasileira de Licenciamento de Marcas (Abral), o licenciamento permite que a marca chegue ao consumidor com mais facilidade, além de agregar mais valor ao produto. “É como ganhar a chancela do dono da marca licenciada”, diz Ferreira. “Com isso, você cria uma vantagem competitiva em relação aos outros players.” Confira nas próximas páginas como funciona o mundo encantado do licenciamento.
O que é licenciamento
De uma forma técnica, segundo definição da Abral, licenciamento é o direito contratual de utilização de determinada marca, imagem ou propriedade intelectual e artística registrada, que pertença ou seja controlada por terceiros, em um produto, um serviço ou uma peça de comunicação promocional ou publicitária.
Na prática, significa conseguir a devida autorização para usar a imagem de um personagem famoso, de um filme ou animação em um produto – como faz a Nutty Bavarian com obras que estão em cartaz. A empresa já usou A Era do Gelo, Turma da Mônica, Senhor Cabeça de Batata e O Touro Ferdinando, entre tantos outros. Recentemente, depois de licenciar os amarelinhos de Minions 2, a empresa colocou à venda quatro modelos de almofadas com os personagens, que podiam ser adquiridas junto com as castanhas açucaradas vendidas nos quiosques.
Como acessar as marcas
As empresas que licenciam personagens costumam ter áreas estruturadas para apresentar soluções ao parceiro interessado, diz Marici Ferreira, da Abral. “No próprio site da entidade, há uma série de contatos por onde o empreendedor pode começar”, ela diz.
Outra forma de fazer isso é contatar diretamente os responsáveis pelos direitos de exploração comercial, diz Bruno Varella, diretor de marketing do Grupo Piticas, rede de lojas que vende diversos produtos licenciados. “Alguns estúdios de cinema e streaming têm escritórios locais no Brasil”, diz o executivo. Adriana Auriemo, da Nutty Bavarian, diz que consegue boas oportunidades de parceria e licenciamento em janelas de lançamento de filmes. “Nesse momento é possível somar os interesses da empresa com os da licenciadora”, explica.
Qual é o melhor personagem?
A empresa precisa ter clareza sobre seus objetivos, decidir que tipo de público quer atrair e, principalmente, entender qual é a sinergia entre seus produtos e a marca que se quer licenciar. “O licenciamento deve estar a serviço de uma estratégia, de um posicionamento e de uma visão mais ampla”, afirma Bruno Varella, do Grupo Piticas.
Para Adriana Auriemo, da Nutty Bavarian, o primeiro passo é entender o valor agregado do personagem a ser licenciado. “Na maioria das vezes, ele possui identificação e empatia com mais de um tipo de público, não se restringindo somente às crianças”, diz, explicando a estratégia da sua empresa. Marici Ferreira, da Abral, reforça que a escolha de uma marca ou personagem é fundamental para o sucesso da parceria. “Uma marca clássica é atemporal, enquanto uma que esteja em evidência no momento ou seja sazonal terá um ciclo de vida menor.”
Quanto custa licenciar
O direito de licenciamento é concedido por tempo limitado em troca de uma remuneração, normalmente definida como um percentual do valor gerado com as vendas ou a prestação de serviços que utilizam o personagem. Segundo Ferreira, da Abral, cada licenciador ou agente da marca trabalha de uma maneira diferente. “Não há uma regra única. É preciso seguir o contrato individual, no qual estão os termos acordados entre licenciador ou agente e licenciado.”
Monica Joseph, gerente comercial e de marketing da Sanrio, que licencia a Hello Kitty, diz que a empresa não possui tabela fixa. “Levamos em consideração projeções de vendas, porte da empresa e canais de distribuição.” No caso da Nutty Bavarian, os valores pagos pelos licenciamentos variam de US$ 10 mil a US$ 20 mil. “Não é qualquer marca que consegue viabilizar a ação. Além do investimento ser alto, é preciso ter escala”, diz Adriana Auriemo.
Quando licenciar
Os personagens são divididos em duas categorias: aqueles que são evergreen e outros que são considerados “hot”, ou sazonais. “Os evergreen são personagens e marcas atemporais, que conseguem se manter relevantes por diversas gerações e seguem investindo no rejuvenescimento de sua base de fãs, como Batman e Mickey Mouse”, diz Varella, do Grupo Piticas.
Já os “hot” são personagens que têm crescimento acelerado e exponencial, mas nem sempre se sustentam no longo prazo. “De qualquer forma, estar atento aos novos lançamentos é essencial, pois eles podem alavancar a aceleração de vendas, o engajamento e os resultados”, afirma. A Nutty Bavarian costuma trabalhar com licenciamentos em prazos que vão de três a seis meses – o tempo varia de acordo com a quantidade mínima de produtos que a marca precisa produzir.
Cuidados com o processo
Quando um empreendedor usa um personagem licenciado, precisa se assegurar de que a imagem do personagem esteja dentro das regras especificadas pela licenciadora. “Há muitas diretrizes estabelecidas em contrato. Por isso, precisamos garantir que toda a rede de franquias esteja adequada às regras e usando os personagens da maneira correta”, explica Auriemo, da Nutty Bavarian.
A marca não é propriedade do licenciado, reforça Varella, do Grupo Piticas. “Existem diversas políticas que precisam ser respeitadas para que o universo e o ‘storytelling’ de cada personagem permaneçam intactos”, diz. “O licenciamento não pode desconstruir o que o proprietário da marca idealizou para o futuro do personagem e de seu universo.” Ferreira, da Abral, lembra que também é preciso cuidado ao escolher o licenciador, checando sempre sua idoneidade e contratos.
Que resultados esperar
Como o produto licenciado tem um alto valor agregado, que é percebido pelo consumidor, acaba funcionando como uma ferramenta de marketing. Mas é preciso ter uma estratégia de vendas associada ao licenciamento. “A empresa precisa implementar um projeto especial que inclua desenvolvimento, aprovação, divulgação no ponto de venda e em mídia do produto ou serviço que faz uso do licenciamento”, diz Ferreira, da Abral. “Com essa estratégia, é possível conseguir recordes de vendas de suas linhas licenciadas.”
A Nutty Bavarian desenha ações promocionais e de divulgação específicas, segundo Adriana Auriemo. “Essas ações ajudam a comunicar a oferta dos produtos e a informar que são limitados e vendidos por tempo determinado, justamente para que nossos clientes possam aproveitar antes que acabe.”
Em resumo: vale a pena?
Não há uma resposta que sirva para todos. Para licenciar, é preciso fazer um investimento relevante e contar com produtos que tenham escala. Mas as empresas que conseguem traçar uma boa estratégia de vendas com produtos licenciados costumam seguir com ela por anos a fio.
“Uma das principais vantagens é poder se apoiar em propriedades já estabelecidas, que muitas vezes contam com grande base de fãs”, diz Varella, do Grupo Piticas. “Isso significa que todo o trabalho de construção, adequação ao público, solidificação e suporte foi e continua sendo realizado pelo parceiro licenciador.” Há ainda a magia que os personagens trazem para o consumidor. “O universo de licenciamento é encantador, pois consegue materializar em produtos a paixão que legiões de fãs sentem por algum tipo de conteúdo”, diz Varella. E você, se encantou por esse universo?
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Fonte: PEGN